A poeira cobria tudo, desde as botas dos trabalhadores até os cães que dormiam sob o sol escaldante do Oeste. Mais uma morte havia ocorrido dentro do velho galpão dos Willbury. Era a quinta aquele ano e o xerife caminhava ao redor do corpo.O cenário era o mesmo dos outros: tudo limpo e no lugar, apenas um corpo no centro do galpão, corpo esse que se encontrava completamente seco. A vítima não tinha nada de diferente, eram pistoleiros ou prostitutas.
- Xerife? Está aí dentro?-Um minuto, Wingate. Não entre.
O xerife saiu do galpão enxugando o suor que estava em sua testa. Enquanto rumava para seu escritório, encontrou Susan Lee - a chinesa que foi vendida pelo pai para um garoto que trabalhava numa das minas da cidade.
- Susan faz dança do dragão para xerife.
- Hoje não Susan.
Ao entrar no escritório, Wingate veio dizendo:
-Jack Montgomery chegou à cidade, está no bordel de Madame Dumousse - Wingate assumiu um ar mais grave – e um dos Chiulipai foi encontrado morto.
- Montgomery pode esperar. Diga, como o índio morreu?
- Igual aos nossos – Wingate parecia desconfortável – venha comigo. Tem alguém que quer falar com você.
Caminharam na direção das minas, mas Wingate levou o xerife para a parte traseira do edifício, onde havia um jovem índio acariciando a crina de um cavalo.Ele cumprimentou o xerife com um aceno de cabeça e ignorando Wingate, disse:
- Rusheine, espírito da destruição matou nosso irmão.
- E você acha que um espírito está matando as pessoas? O jovem confirmou com a cabeça – Supondo que eu acredite nisso, como parar o espírito?
- Espírito não morre. Procure homem de alma suja, homem sem medo.O jovem partiu deixando um Wingate sem palavras e um xerife pensativo.
- Acredita nisso xerife?
- Por que não Wingate? É a melhor pista que temos. Se é que isto é uma pista.
- Já que acredita, quem é o homem sem medo? Você, por acaso?
- Não. – O xerife olhou na direção das minas sem enxergar. – O que quer dizer alguém com alma suja?
- Talvez alguém que já tenha matado e se for isso todos no oeste têm alma suja.
A resposta veio para o xerife junto com uma nuvem de poeira: Montgomery.
- Aonde vai? Perguntou Wingate seguindo o apressado xerife.
- Falar com alguém.
O bordel de Madame Dumousse estava cheirando a couro, suor e bebida, sem comentar a nuvem de fumaça que saia dos charutos e cigarros acesos. Jack Montgomery encontrava-se reclinado em uma cadeira com um cigarro entre os dentes, uma mulher ao seu lado e um péssimo jogo de cartas nas mãos.
- Montgomery?
- Xerife?
Não foi preciso mais do que isso para Montgomery abandonar o jogo e sair do bar. Sem demoras o xerife explicou o que vinha acontecendo e embora Montgomery não acreditasse no o outro lhe contou, aceitou o plano do xerife.No começo da noite, Wingate, Montgomery e o xerife começaram a patrulhar a cidade. Seus sentimentos eram um misto de medo com apreensão, e até expectativa. O pequeno grupo passou suas primeiras horas, encontrando apenas pequenos animais e alguns bêbados que saiam dos bares que estavam fervilhando com o começo de mais uma noite. E enquanto Montgomery passava pelo bordel de Madamme Dumousse, ele viu algo se movendo na escuridão. Apreensivo, ele parou e observou. Alguém andava pelas bordas da cidade, alguém que parecia ser mais negro que a escuridão da noite caminhava tranquilamente, sem nenhum medo de ser descoberto. Montgomery seguiu a distância o que ele acreditava ser um bêbado. Não muito tempo depois, Wingate também viu algo se movendo na escuridão, mas acreditando ser um dos muitos animais que ele já havia visto, decidiu ignorar. Apenas Montgomery e o xerife – que viu a figura recortada na escuridão pouco depois de Wingate, seguiam o que acreditavam ser um homem – fantasma.
Continuaram a seguir o homem até o bordel de Madamme Dumousse e decidiram que era apenas mais alguém procurando diversão, mas pouco tempo depois viram o homem próximo ao galpão dos Willbury. Montgomery e o xerife pararam quando o homem entrou no galpão.
- O pegamos! Sussurrou Montgomery apagando seu charuto.
- Pode não ser ele. Vamos chamar Wingate.
Quando Wingate chegou, os três deram várias voltas no galpão, procurando ver o que acontecia em seu interior. Quando estavam quase para desistir escutaram passos vindo da rua principal. Era Susan Lee que olhando para os lados, entrou no galpão. Surpresos, ninguém sabia que decisão tomar. Por fim, o xerife decidiu entrar com Montgomery e deixar um feliz Wingate na porta, como vigia.Quando entraram no galpão, tudo estava escuro, mas sons vinham da parte dos fundos, longe da porta. Eram como grunhidos. Os dois permaneceram nas sombras, esperando seus olhos se acostumarem com a escuridão dentro do velho galpão. Aos poucos começaram a se moverem, escutando apenas o barulho de suas respirações e os baixos grunhidos. Quando estavam quase no meio do galpão escutaram Susan Lee falar:
- Dança do dragão agora?
Apenas outro grunhido de resposta.Montgomery e o xerife esperaram um momento e logo depois recomeçaram a andar lentamente. Pouco a pouco, foram se aproximando do fundo do galpão, onde havia mesas e algumas ferramentas enferrujadas. Nenhum dos dois ainda tinha pensado no que fariam quando atingissem seu objetivo, mas mesmo assim continuaram. Quase no fundo do galpão, os dois pararam. Um esperava para agir e o outro pensava no que fazer.Enquanto eles ficavam parados no escuro, Susan Lee dançava e murmurava coisas em chinês. Enquanto ela girava de uma maneira pouco graciosa, Montgomery a agarrou pela cintura e o xerife pulou na mesa segurando o suspeito. Mas o que ninguém esperava é que não havia suspeito nenhum, nem mesmo Susan tinha reparado que seu cliente tinha saído. Os olhos dos homens se encontraram e Montgomery xingando, tirou um charuto do bolso e procurou com o que acender.
- Fogo?
O xerife virou e olhou a pequena chama que brilhava num canto do galpão. A chama não iluminava muito, mas intrigava bastante. De repente, uma grande labareda de fogo apareceu e o xerife entendeu que alguém havia botado fogo no resto de feno que tinha dentro do galpão. Empurrando Susan Lee, Montgomery sacou sua Colt 45 e preparou o disparo. Mas o som não veio. Na trêmula luz que o fogo provocava dentro do galpão, o xerife viu Montgomery estendido no chão, tentando levantar. Susan Lee estava encolhida num canto e o xerife também sacou sua Colt 45, engatilhou e preparou para disparar. O suspeito, que estava ajoelhado ao lado de Montgomery, levantou lentamente limpando algo que escorria pelo seu queixo. O xerife levantou a arma e apontou no peito do homem, mas o choque o fez parar de respirar. Um homem alto, com ombros largos e peito nu estava parado exatamente onde o cano de sua arma acabava, como que pedindo para o xerife atirar nele. Seu cabelo parecia que tinha vida ao seu redor, criando um aspecto sombrio para o homem, mas o que surpreendeu o xerife foi que ele reconheceu seu suspeito: O jovem índio.
- O que você faz aqui? Saía antes que eu meta uma bala entre seus olhos! O xerife cutucou o peito do jovem com o cano da arma.
- Não.
Sua voz era clara, não deixando dúvidas ao xerife que continuava olhando para o jovem sem acreditar. Tão repentino como uma explosão, o índio jogou o xerife para o outro lado do galpão. O xerife bateu a cabeça e sentiu o sangue escorrer por sua nuca. Sua arma tinha caído quando ele tinha sido atingido e meio zonzo ele viu o índio vindo em sua direção. Ele levantou e olhou para o jovem surpreso.
- Isso não era necessário!
- Rusheine tem fome, fome de alma suja.
Uma pancada atingiu o xerife nos pulmões tirando seu ar e o fazendo ficar curvado, outra veio logo em seguida e ele sentiu suas costelas se partindo. O xerife agarrou as pernas do índio, tentando derrubá-lo, o que foi inútil. Outro soco e o xerife estava com a cara no chão. Ele se arrastou tentando chegar até sua Colt, mas ele sentiu o índio quebrando suas pernas. Mesmo abatido, o xerife não parava de pensar no porque o jovem estava fazendo isso. Suas palavras ecoavam na sua mente: Rusheine tem fome... Fome de alma suja... Então o xerife olhou para Montgomery caído e entendeu. O homem era mais um corpo completamente seco e o xerife sabia que haveria outro: o dele. Tentando desesperadamente alcançar sua Colt, ele sentiu o índio com a mão na sua nuca e seu hálito quente. Rapidamente sua vida estava sendo sugada e o xerife desmaiou.
Pouco tempo depois o índio levantou e olhou ao redor, avistando Susan Lee. Ele sorriu. Susan gritou.